domingo, 7 de agosto de 2011

DESCULPE QUALQUER COISA!



A nossa realidade é carregada de procedimentos sociais que compõe o nosso roteiro de vida, fazendo com que venhamos a agir de forma quase que robotizada para que possamos interagir, nos adequar e integrar a um grupo de pessoas. Tantas vezes, esses procedimentos incorporam o nosso padrão social e de comunicação sem que haja o menor nexo e sim, apenas para cumprir a tabelinha society. Frases ou expressões que as pessoas dizem umas as outras sem que haja qualquer significado, sentimento, dando a nítida sensação de que vivemos em um estado teatral e de total perda de sentido e tempo. Assim como aqueles e-mails que estão na caixa de saída do seu computador, que basta apenas uma conexão à internet para que ele seja‘disparado’, algumas frases são ditas de forma tão repetitiva e automática que me fez parar para perguntar o porquê da sua existência.
Quando alguém te diz, por exemplo, para 'aparecer QUALQUER hora na casa dela', sem que exista entre vocês alguma intimidade, é nítido que a tradução desta frase está ligada a qualquer coisa, menos a de um convite verdadeiro. Talvez seja uma maneira simpática criada para que pessoas pudessem se desvencilhar uma das outras sem maiores constrangimentos pelo o assunto já ter acabado. Ou possivelmente isso deve estar relacionado a herança de comportamento social ligada aos nossos antepassados, que viviam de maneira mais próxima, onde o convívio era algo mais duradouro e convidar alguém à sua casa sem que houvesse necessariamente amizade, era algo muito comum. Enfim, a expressão perpetuou em nossa vida sem que déssemos conta que o nosso perfil comportamental mudou.
“Apareça QUALQUER dia lá em casa... Me ligue QUALQUER hora. Você talvez até o faria, se soubesse aonde ela mora e se tivesse o telefone dela.
Uma coisa muito comum de acontecer quando você reencontra alguém que não vê há muito tempo e que também não é nada intima sua, é passar de imediato por uma análise precisa do seu estado físico, o que na tradução significa a análise do seu IMC, sendo que noventa e nove por cento das vezes essa análise nunca corresponde pelo seu estado real, ou seja, esta criatura sempre vai te deixar com a consciência pesada por ter comido aquelas coxinhas a mais na festa de aniversário do teu primo. Passada a fase da supervisão raio laser, vem àquela famosa e inútil pergunta:
- E aí, já casou?
E eu te pergunto; o que é que vai mudar na vida dessa criatura saber se você já casou ou não? Se você se separou e se teve 3 filhos?? Nada!
É engraçado perceber o quanto o nosso estado físico somado ao nosso estado civil tenha tanta importância para as pessoas no geral.
Pior do que uma pessoa afirmar que você está mais velho e gordo e te convidar para ir a um lugar cujo endereço você não tem, é receber um pedido de desculpas por algo que você não sabe o que aconteceu, ou melhor, se aconteceu. A expressão mais popular dita em um final de tratado comercial ou visita social é o “desculpe qualquer coisa” e todas as vezes que eu retruco indagando o porquê da desculpa, ouço sempre a mesma resposta:
- “Ah, não sei... Vai que...” Exatamente como o jargão de uma campanha publicitária. Vai que...Já sabe, né?
O ruim que isso dá brecha para você ficar desconfiado e achar que alguma coisa realmente aconteceu e desta forma, já corre para verificar se o banheiro não está inteiro mijado, se não tomaram aquela ultima cerveja importada que você camuflou na geladeira. Ou se quastiona se o omelete que te serviram no almoço não caiu no chão e foi lambido pelo cachorro.Vai que...
Alguns sociólogos acreditam que essa expressão está ligada ao nosso passado escravagista ou segundo Gabriel Perissé que é doutor em Educação pela USP e escritor: “Pedimos desculpas como gesto de boa educação, expletivo sem motivo, maneira de provar que temos boas maneiras, que somos gente boa, pobre, porém honesta? Do que sentimos culpa, afinal? Que remorso é este? E há medo? Medo do inferno?".
Uma coisa não há duvida, o excesso de pedido de desculpa é o retrato de uma auto-estima baixa, frágil que carrega uma estranha culpa embutida em nosso DNA. Tem gente que exagera tanto que até quando termina de transar deve soltar um “desculpaaaaaaa qualquerrrrrr coooooiiiisaaaaaaaaa”.
Talvez isso também possa ser excesso de senso critico, afinal antes que você pense em criticar, a pessoa já sai na frente se desculpando porque ela mesma não se permite errar. Pode ser um excesso de vaidade, onde no fundo ela só precisa ouvir de você que foi a melhor recepção e encontro ou serviço da sua vida, que ela é máster, power, mega, ultra sensacional.
Mas isso também não importa, o que está em questão aqui não é ato de desculpar-se e sim em transformar essa nobre ação em algo banalizado e sem sentido, afinal quando é realmente necessário pedir desculpas, raramente é feito.
Quantas vezes você não quis que alguém te pedisse desculpas e ela não o fez?
Se agirmos de forma natural, prezando a boa educação e a deliciosa gentileza, não há motivos para nos sentirmos devedores a alguém, sejam em tratados sociais, comerciais ou íntimos. No fundo, neste mundo, todo mundo gostaria de ser rico, famoso, bonito e aceito. E não é agradando a todos 100% das vezes que você vai conquistar essa formula da receptividade ou de aprovação.
Portanto, fica aqui o meu NÃO para toda essa baboseira social. Se não quiser uma pessoa na sua casa, não convide. Se não tiver real interesse pela história de vida de alguém, não pergunte e se perguntar, preze pela boa educação. E se desculpe sempre, mas principalmente quando realmente fizer sentido para a pessoa que está recebendo esse perdão.

That´s all folks!












Fernando Gonsalez



quarta-feira, 9 de março de 2011

Eu desejo a você...



 
Nunca é tarde demais para ser quem você quer ser.
Não há limite de tempo, comece quando quiser.
Mude ou continue sendo a mesma pessoa, pois não há regras para isso.
Pode tirar o máximo ou o mínimo, espero que tire o máximo.
Espero que veja coisas surpreendentes, que sinta coisas que nunca sentiu antes.
Que conheça pessoas com pontos de vista diferente.
Que tenha uma vida na qual se orgulhe.
Mas se não se orgulhar dela, que encontre forças para começar tudo de novo.

 
Texto extraído do filme benjamin button 

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Temporariamente Fora De Serviço.

Ao que tudo indica, o verdadeiro inventor desse dispositivo de telecomunicação denominado telefone, foi o italiano Antonio Meucci, em meados de 1860, ganhando o nome de telégrafo falante. Meucci vendeu a patente para o Sr Alexander Graham Bell, que levou a fama pela invenção.
Invençãozinha fantástica! Embora, eles não tivessem ideia do que isso iria promover em nossa vida.
Eu faço parte de um micro e excluído grupo de pessoas que não gosta de telefone. Não gostamos de atender telefone, não gostamos do seu toque insistente, das ‘musiquinhas’ de espera nas linhas, dos serviços das empresas telefônicas, das centrais de relacionamento! Ou seja, detestamos a sua existência, mesmo cientes da sua vital importância. O motivo? Profundamente, só um bom terapeuta explica...Mas superficialmente, posso falar por mim e desta forma, vou lhe contar minha experiência com essa ferramenta de comunicação safada.

Nos meus tempos de moleca o telefone era artigo de luxo, como já disse aqui neste blog umas trinta e oito vezes, era tão difícil ter telefone que tinha até gente que investia todas as suas economias em linhas e vivia maravilhosamente bem de renda telefônica. Eu fazia parte da população ‘dependentes do orelhão’ e para a minha sorte eu morava próxima de uma pracinha que possuía um orelhão de esquina da Telesp. Sempre fedido, mas pelo menos não tinha aqueles anúncios de ‘mulher de tolerância’.
Meu pai olhava os classificados de domingo procurando um monte de coisa para comprar (inclusive telefone) e adivinhe quem era a pessoa responsável em ligar para obter as maiores informações? Eu, claro! Só porque eu detestava fazer isso, sobrava pra mim.
Levava umas duas dúzias de fichas, aquelas redondinhas que pesavam, no bolso do meu short e a merda é que você perdia mais tempo colocando as fichas para a linha não cair do que prestando atenção na conversa. Obviamente, eu me esquecia de perguntar um bocado de coisas e voltava umas oito vezes para finalizar a missão. Era o meu pai pegar os classificados que eu dava um jeito de pegar minha bicicleta e‘voar, voar, sumir, sumir’... Mas, normalmente essa incumbência era sempre minha. Mais tarde descobri que meu pai também odiava fazer isso...
Quando a família conseguiu comprar uma linha para a casa, foi o evento! Eu ficava rodeando o aparelho como se estivesse diante de um parente distante: ‘Já ouvi falar de você, mas não sabia que você existia mesmo’. Uma mistura de desconfiança com felicidade. Adeus orelhão fedido!
A ‘farra das boi’ acabou quando a Telesp foi privatizada, aí foi liberado linha para todo mundo.

No começo da década de noventa, vieram os aparelhos de celular, o primeiro no Brasil se eu não estou enganada foi lançado pela Motorola e era considerado o ‘fuscão’ dos aparelhos porque parecia um radio comunicador de seguranças. Enorme! Você podia chutá-lo, arremessá-lo pela janela que o máximo que podia acontecer era mandar alguém para o hospital, mas o aparelho continuava inteirasso.
Depois desta incrível invenção do telemóvel, a paz no mundo acabou.
Você sabe o que é mais desagradável de um celular? O fato de todo mundo te achar o tempo todo!
A partir daí, a sua liberdade começou a ser controlada; celulares, câmeras, chips...hehehe. E olha que tem maluco que já criou um sistema em que você consegue visualizar o sujeito do outro lado da linha. Ou seja, atender aquela ligação importante no Motel, nunca mais.
Quero deixar bem explicito aqui que isso não está relacionado com culpa no cartório, atitudes suspeitas e sim, com a privação do nosso direito constitucional de privacidade. Aí que saudade que tenho dela.
Um exemplo: Se você está em uma reunião, no banheiro ou com uma batata inteira na boca e não pode atender ao telefone quando toca, a boa educação faz com que você retorne assim que for possível, correto? Então porque é que sempre ouvimos a mesma interrogação exclamativa:
- "Ué! Eu te liguei agora e você não atendeu! Por que??"
É obvio! Se eu não atendi porque não podia, ‘caspita’!
Hoje em dia, quando alguém liga para você, parece que existe uma regra em que você deve
atendê-lo imediatamente, como se o aparelho de celular fosse um membro adicional do seu corpo.
O mais hilário de tudo isso, é eu que sou uma profissional da área de vendas e o telefone é a principal ferramenta de um vendedor, mas com a introdução do celular em nossas vidas acabou o bom senso do horário. Tem gente que já me ligou às 23 horas para tratar de assuntos que facilmente poderiam ser resolvidos na manhã seguinte.
Foi-se o tempo que só médico ficava de plantão...

Tenho outro problema muito pessoal que vou dividir com vocês. Eu não processo ao acordar. E você já reparou que o telefone sempre toca quando você resolve tirar aquela soneca ou está fazendo algo que só você pode fazer por você mesmo? Já atendi telefone sonhando e ao atender, exclamei:

- "NÃO!! EU NÃO QUERO MAMÃO!!"

Eu ainda estava sonhando com mamão, mas quem estava do outro lado da linha não, e dificilmente seus amigos ou novo namorado, conseguem entender a sua deficiência mental quando acaba de acordar.
Outra coisa que aborrece é a famosa pergunta que fazemos quando ligamos na casa de alguém que aparentemente foi acordado pelo nosso telefonema:
 
- Você estava dormindo??? Te acordei????
Putz! É claro que a criatura estava dormindo.
Para perguntas absurdas, respostas cretinas:
-"Não, não estava dormindo não... Estava apenas interagindo com o intestino delgado e grosso no banheiro"...
É constrangedor também aquele núcleo de pessoas que utilizam o aparelho celular como ‘dama de companhia’ e passam mais tempo mandando torpedo do que interagindo com os demais terráqueos ao seu redor.
É horrível ser trocado por um aparelho de celular ou pelas redes sociais...
Não, não vou citar os amados do telemarketing porque isso já esta obvio demais. É um ódio unanime, oras bolas.
Mas vou contar algo engraçado que acontece com a minha mãe, que é estrangeira e tem um nome diferente. Ela chama-se Iride e se lê exatamente como se escreve, sem mistério, mas os agentes do ‘’estaremos tentando desligar o telefone’, ao ligarem para minha casa atrás da minha mãe, pronunciam cada barbaridade.
- Por favor, gostaria de falar com a senhora Fride; Tride; Cride; Ilde; Urilde; Freak (!!!!!!)
Aí é muito fácil dizer:
- Não existe ninguém com esse nome, passar bem!
Tudo bem que ninguém tem a obrigação de acertar um nome estrangeiro, mas eles NUNCA acertaram o nome de ninguém! Eu sei o porque, mas deixa pra lá.
Não é DESESPERADOR quando você tem que ligar em uma central de relacionamento de uma empresa para resolver algum problema??
Eu costumo pedir até ajuda pra Deus, mas Ele também já desistiu.
Acabei me lembrando de uma frase de Tom Jobim sobre Nova York, que vou plagiar e incorporar ao tema: Telefone é bom, mas é uma merda. Ficar sem telefone é merda, mas é bom!
Agora se você estava pensando em me ligar e depois de ler isso desistiu, eu vou entender. Faça melhor, venha em minha casa, me escreva, me mande um telegrama, uma carta, um torpedo, uma pomba, mas não me deixe pendurada no telefone em um dia de domingo.Hehehe...

That´s all folks!

Garoto Enxaqueca.


quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

GOSTO...



Eu gosto é da Mistura...
Da diferença que não me deixa burra.
Da incerteza nada oculta.
Da safadeza desnuda e pura.

Eu gosto é do Gosto...
De uma loucura meio lúdica.
Do oculto que se faz atrás do muro.
Do puro exposto a publico.

Eu gosto é do Explicito...
Da palavra ao pé do ouvido.
Da molecagem que acaba em riso.
Da punição pelo sassarico.

Eu gosto é de um todo...
Da mistura que se transforma em novo.
Do explicito gosto da mistura.
Que se mistura ao gozo.
Eu gosto do gosto.
Eu gosto.



segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

ERA UMA VEZ...


Eu sempre acreditei e continuo acreditando que a melhor época para se viver é a atual, porque tenho a impressão de que quando vivemos de passado nos acovardamos diante do presente, sem falar que é um grande desperdício de tempo. Mas inevitavelmente há momentos em que sou bombardeada por pequenos filmes rodados em super 8 que ‘deslizam’ na minha cabeça.
A minha vida é marcada de cheiros, cores, sons, pessoas, enfim, um conjunto de tantas coisas... Mas também marcada por uma nostálgica sensação de que já vivemos em uma época onde o sentimento natural de satisfação pela vida e pelas coisas, prevalecia.
Lembro-me que morávamos em casas maiores ou mais espaçosas, onde o verde tinha mais regalia em relação ao cimento e a lajota. Os móveis e os eletrodomésticos, assim como os relacionamentos, as amizades e os empregos, eram feitos para durar.
Cada casa tinha uma árvore que exalava um cheiro peculiar, cheiro esse que misturava-se aos dos bolos ao entardecer.
O leite era entregue em garrafas de vidro na porta da sua casa, junto com o pão e acredite, ninguém os roubava ou te sacaneava.
Cada família tinha seu animal de estimação, amado, mas sem ser tratado como filho postiço com roupas de grife.
Os carros eram mais quadrados, menos equipados e não eram de plástico.
O futebol era arte, mais camisa e menos contrato.
Os mercados ficavam abertos até às 7 horas da noite de um sábado, as compras eram levadas em sacolas de papel e ninguém deixava de suprir as suas necessidades.
Não tínhamos telefone porque isso era artigo de luxo e muito menos computador e inacreditavelmente, ninguém deixava de se encontrar, de sair, de namorar... Ninguém se esquecia tanto dos seus compromissos. Passávamos mais tempo juntos nas calçadas conversando e os abraços eram mais habituais, porque ninguém tinha tanto medo de se tocar.
Nos olhávamos mais.
Monteiro Lobato não era racista, Nelson Rodrigues não era pedófilo, Hitchcock não era psicopata e ao invés de Luciano Huck, tínhamos Chacrinha.
Os fumantes eram tratados como pessoas normais.
E por falar nisso, éramos menos sarados, turbinados, menos plásticos e podíamos nos dar ao luxo de viver como pessoas reais.
Nós mulheres éramos tiradas para dançar nos bailinhos improvisados do bairro, afinal ninguém tinha tanta vergonha em se divertir, muito menos em dançar coladinho.
Éramos pedidas em namoro e pedíamos um tempo para pensar...E os homens não desistiam de você.
Pelo menos nos livramos das ombreiras, das calças saint tropez, do ultimo governante de resquício militar (João Figueiredo) e do estigma e titulo; “somos do terceiro mundo”.
Matávamos menos, tolerávamos mais.
Criança roubava... Goiaba.
Ter caráter não era diferencial e a palavra tinha mais poder que contrato e promissória.
Tínhamos menos liberdade de imprensa, de expressão, de opção e para assumirmos nossas diferenças e talvez por isso, tínhamos menos conformismo.
O politicamente correto nunca foi a nossa bandeira.
A vida não era mais fácil, nunca foi e tudo isso não faz tanto tempo assim. Mas a vida anda passando tão rápido...
Tempo era algo que sempre tivemos, mas hoje parece que dá status viver ocupado.
E alguém propagou nesses últimos anos que devemos viver intensamente todos os minutos de nossa vida. Um alguém provavelmente muito inconsequente para propagar tamanha insanidade.
Como não tínhamos essa necessidade insana, todo minuto era muito bem vindo para se viver como se podia. E como exigíamos menos da vida, ela nos devolvia... Devolvia-nos em dias menos tribulados, mais vividos.
Se a vida era mais fácil? Nunca foi...



That´s all folks.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

O SÁDICO E O MASOQUISTA.

Noite úmida e quente de sexta feira, o relógio mostra 20h37 para os olhos escuros e ansiosos de Clarice que não vê à hora de chegar em casa para desfrutar o tão esperado final de semana. Passou o dia clamando a Deus para que seu turno acabasse, eis que Ele a ouviu.

Tenta se enganar dizendo que o cansaço vai cessar e a rotina é sempre a mesma, onde aguarda a carona de seus amigos para que juntos possam finalmente exorcizar.
Com milhares de bares, restaurantes e boates por aí, Clarice está sempre em busca do novo, mesmo ciente de que as noites são tão repetitivas que mais parecem cenas de ‘deja vu’ no replay. Mas eis que um amigo mostra algo que parece ouro; convites Vip para inauguração de uma nova casa noturna. Seus olhos brilham e ela não pára de perguntar:
- Somos Vips mesmo?
Bendita seja a sensação de exclusividade no ar, onde todos tem a nítida certeza de que aquela noite será a melhor. Uma certeza tão grande que nem o estacionamento lotado, tão pouco a fila quilométrica, os incomoda.
Duas horas de espera é o suficiente para perderem a paciência e tentarem convencer o segurança da casa:
- Somos Vips!! Esbravejam.
Segurança de boate é como as enormes ondas do mar, por mais que você nade e nade para alcançar o mar adentro, sempre será empurrado para a areia de volta. Isso é segurança de casa noturna. Eles não nos querem lá, mas nós insistimos.
Depois de muito suadouro para conseguir entrar na boate, Clarice se dá conta de que aquele convite vip na valia para muita coisa, exceto para não pagar a entrada que normalmente é infinitamente menor do que o preço de qualquer bebida que escolha no bar.
Ah! O bar... A primeira providencia é molhar a garganta seca e mais uma vez ela se depara com uma multidão enfurecida a sua frente clamando pelo mesmo.
O cara mais poderoso de uma casa noturna é certamente o barman. Diríamos que ele é o senador das baladas, pois é ele quem decide o que, como, quanto e quem vai beber primeiro.
Ela até tenta jogar um charme para um deles, mas é atropelada por cavalos selvagens com camisetas com a seguinte descrição: ‘Eu amo jiujutsu’. E após trinta minutos sendo ‘esmagada’, alcança a ponta do bar e descabelada recebe a atenção de um barman que a atende com um olhar de piedade.
Irritada tenta encontrar o banheiro para recompor a maquiagem e a bexiga. Leva algumas passadas de mão, perde-se em meio de um labirinto e fica meio cega por causa do strobo. Quando finalmente o encontra a sua felicidade é a mesma de ter achado o cálice sagrado, mas é surpreendida por um exército feminino aglomerado fazendo o habitual: Um fórum sobre seus relacionamentos enquanto aguardam a vez.
Percebe que o banheiro masculino flui e isso era tudo que ela mais queria: Agilidade ‘mijatória’. Ela já não sabe mais se o que a irrita naquele momento, são as vozes das 30 mulheres juntas, se é a bexiga explodindo ou se é o DJ ruim que parece estar fazendo exorcismo na pista.
Na pista se vê, por alguns segundos, hipnotizada por um cabelo roxo ‘fluorescente’ quando é surpreendida por um amigo que grita em seu ouvido:
- ELA É MODERNAAAA!!!
Naquele instante Clarice só conseguia se sentir velha...
Chegada a hora de partir, é a hora de encarar a fila para pagar a comanda e bêbado sempre acha que tem preferência em fila de boate. Ciente disso, ela sabe a importância de reservar cada milímetro de espaço dentro dela, exatamente como a baldeação da estação da Sé, qualquer deslize e você não sai daquele lugar tão cedo.
No caminho de volta para casa o assunto é um só: A merda da noite!
Pensativa, murmura:
- A noite é tão sádica...
No portão da sua casa é mais uma vez surpreendida pelo amigo que lhe diz antes de partir:
- Te ligo para saber o que faremos amanhã à noite!
Ela, com um sorriso largo nos lábios, concorda. 
Moral da história: Para todo sádico sempre existe um masoquista. 




domingo, 23 de janeiro de 2011

O DIA QUE NOS DIVORCIAMOS DE NÓS MESMOS.

   
A palavra verdade vem do latim 'veritate'. Em nosso dicionário significa ‘conformidade com o real; exatidão, realidade; sinceridade e boa fé. Coisa verdadeira ou principio certo’. Mas na prática, a verdade é subjetiva, relativa, abstrata.
Para Nietzsche, por exemplo, a verdade é um ponto de vista. Ele não define, nem aceita a definição da verdade porque para ele não se pode alcançar uma certeza sobre isso.
Em suma, ela não existe e está relacionada acima de tudo, com suas crenças, valores, cultura, condicionamento social e psíquico.
Se a verdade não existe porque exigi-la? O que nos move em buscá-la? E por que essa incansável necessidade humana de exigir a verdade do outro? Um confronto que nunca cessa. Seria uma tentativa de fugir de nós mesmos?
De fato, há verdades estipuladas, enraizadas no nosso código genético ou em nossa condição humana, nos programando, codificando para que não escapemos dela. E que verdade é essa?
Uma verdade tão bem contada que nos faz esquecer quem realmente somos.
Uma verdade carregada de paradigmas, exigências, superstições, padrões, regras, patamares e metas quase inatingíveis.
Que verdade é essa que transformou o dinheiro em Deus?
Será a mesma que te provoca em dizer que antes você deve ganhar dinheiro para depois fazer o que gosta? Ou você será punido se fizer algo que gosta sem ganhar dinheiro?
Uma verdade que te faz crer que o merecimento vem com o sacrifício. O sacrifício de abrir mão de ser quem você realmente é.
Uma verdade que se baseia no ter e de certo, as recompensas materiais servem para que de alguma forma nos sintamos gratificados pelo fato de estarmos perdendo o que realmente nos interessa. Talvez seja o tempo que gostaríamos de ter para fazer tudo diferente, para viver de forma mais decente, esquecendo da recompensa por essa vida besta.
Uma verdade tão superficial que faz com que a imitação, a ‘boa política’ e a submissão, seja o nosso único e frágil escudo para enfrentar a exclusão.
O não tentar, com medo do errar, do falso julgamento, eis que vem o atropelo chamado arrependimento.
Seguir caminhos óbvios e já conhecidos é mais prazeroso do que o tortuoso caminho da escolha solitária. Sim, quando ouvimos a nós mesmos e seguimos nossa verdade o caminho se torna as vezes solitário, outras tantas, vulnerável. Mas há a recompensa da leveza, da autenticidade, da real sensação de liberdade, de uma estranha e enorme coragem.
Você é capaz de fugir e fingir para muitas pessoas e por muito tempo, mas jamais será capaz de fazer isso diante de você mesmo e de certo você será sempre o seu pior juiz.
Quando a mascará da perfeição cair esteja atento para se descobrir, para começar tudo de novo.
A vida é curta demais para viver as histórias, os desejos e aspirações dos outros.
Se admita, se liberte, se permita e viva a sua verdade.
Verdade? Que verdade?




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